São 6:30 da tarde, horário de Londres, 12 de Abril. Em meio à primavera, a magnólia no jardim já começa a perder suas flores. No escritório, imprime-se a última folha do mais novo relatório da organização inglesa Volans: The Biosphere Economy, uma revisão sobre economia global voltada aos serviços ambientais.
A definição mais simples de uma organização think tank é a referência a um instituto de pesquisa que se dispõe a resolver problemas ou estabelecer planos futuros de desenvolvimento. Contudo, tal definição não mensura a importância atual desse tipo de organização.
O surgimento desse modelo não é muito antigo. Embora existam think tanks do começo do século XX (como a Federal Trust ou Royal Institute of International Affairs), o marco foi o livro de Paul Dickson, Think Tank, de 1971. De lá para cá, o número de organizações cresceu, apresentando grande influencia em todo o cenário político e econômico.
O produto básico de uma think tank é a produção de relatórios. Diferentemente de uma produção científica, os relatórios são mais atuais e dinâmicos. Enquanto um artigo científico demora de um a dois anos para ser publicado, o de uma organização think tank costuma ser produzido em prazos bem mais curtos. Embora as informações contidas em relatórios não se submetam ao mesmo rigor acadêmico exigido em uma produção científica, elas são, normalmente, mais adequadas à velocidade exigida pelas políticas econômicas e pelo mercado. Um exemplo claro se deu no processo de criação da União Europeia, em que, segundo pesquisa coordenada pelo consultor de políticas energéticas Stephen Boucher, os debates políticos e imposições de metas foram majoritariamente baseados em relatórios produzidos por think tanks (Boucher & Hobbs 2004).
Hoje, diante da atual crise ambiental, esse tipo de organização começa a ter mais um importante papel: o de direcionar os caminhos da sustentabilidade.
O primeiro modelo de think tank com a proposta de sustentabilidade surgiu em 1987. Poucos meses após o lançamento do relatório Nosso Futuro Comum, do Comitê Brundtland, John Elkington e Julia Hailes criaram a SustainAbility. Essa organização, no entanto, não foi concebida como uma simples organização think tank. Ela é uma hibrida (no inglês hybrid), parte think tank, parte consultoria. A SustainAbility não apenas gera relatórios de tendências, conciliando as necessidades econômicas, ambientais e sociais, como também presta consultoria para agregação de um modelo sustentável em outras organizações.
Em um primeiro momento, esse modelo híbrido, que parecia ser uma perda de energia para a realização da consultoria, começou a ser replicado. Alguns bons exemplos na Europa são Tomorrow’s Company e a Utopis, criadas em 1993, a Forum for Future (1996) e Futerra (final dos anos 90). Em 2008, o próprio John Elkington, na companhia de mais três outros especialistas, fundaram uma segunda organização no mesmo modelo, a VOLANS.
Mas por que esse modelo vem sendo replicado?
Segundo Sam Lakha, gerente de desenvolvimento da VOLANS, a resposta deve vir em forma de pergunta: “Se temos informação adquirida através das consultorias, por que não compartilhá-las?” E continua “O que resume um think tank é o auto-questionamento permanente, a busca da informação e o compartilhamento dela. Ele pode estar na figura de uma organização ou até de uma pessoa que busca o conhecimento.”
No entanto, esse modelo híbrido de think tank / consultoria tem sido reproduzido em alguns países principalmente em virtude das possibilidades de lucro que gera. E o motivo é simples. Ao se dispor a gerar e receber conhecimento, a organização partilha suas missões e valores com diversas redes de contanto. Um relatório produzido chega normalmente à mesa de diversos CEOs de grandes empresas. São grupos e parceiros que cada vez mais vão sendo agregados.
Uma terceira função que pode aparecer em algumas instituições é o broker. Suas atividades consistem basicamente em quebrar barreiras de contatos. Na situação em que duas instituições têm potenciais para se somar, o Broker trabalha para fortalecer os laços. Seria o mesmo papel daquele colega que apresenta uma amiga, porque acha que ela tem muito a ver com você.
O poder de marketing de um think tank e, ocasionalmente, do broker, é fantástico. Pois esse processo de socialização não apenas divulga o nome da organização como demonstra a sua competência em gerar informações e estabelecer redes. O tempo perdido à elaboração de relatórios ou à criação de redes reverte-se na forma de clientes para a consultoria da organização. É o compartilhamento da informação gerando lucro.
Vale lembrar que quanto mais trabalhos de consultoria houver, mais informações para a produção de relatórios serão geradas e mais redes de contato criadas. As organizações híbridas estabelecem um modelo que se retroalimenta.
Pela experiência dessas organizações, o resultado não é imediato. Muitas vezes as funções de think tank ou broker podem demorar alguns meses para resultar em benefícios. Mas, se bem feitas, ocorrem com certeza. Segundo Sam Lakha, o atraso na resposta, por exemplo, de um relatório, é saudável: “Preferimos que as organizações ou pessoas físicas que leram o relatório interpretem e repensem toda a informação contida. Esse processo, que pode levar de seis meses a um ano, permite que após decidirem buscar a consultoria, estejam mais convictas dos seus objetivos”, afirma.
No Brasil, esse movimento ainda é pequeno e quase inexistente. Empresas na área de consultoria em sustentabilidade ainda prezam pelo modelo simples. A falta dessa oferta de serviço faz com que companhias brasileiras interessadas em identificar tendências em sustentabilidade busquem esse tipo de competência no exterior. Cabe o exemplo do relatório Rumo à Credibilidade: uma Pesquisa de Relatórios de Sustentabilidade no Brasil – embora conte com a participação da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS), as outras duas organizações autoras são internacionais.
Apesar das empresas brasileiras não trabalharem nesse modelo híbrido, elas já possuem informação e competência para tanto. Existem trabalhos de consultorias, na área de sustentabilidade, que são referências internacionais. Mas o que faltaria a elas então? A resposta pode ser encontrada na frase do escritor, jornalista e dramaturgo irlandês George-Bernard Shaw: “Existem dois tipos de pessoas na vida: as que veem o mundo como ele é e se perguntam: ‘Por quê?’ E as que imaginam o mundo como poderia ser e se questionam: ‘Por que não?’ ” Agora, cabe a cada um escolher.
Rafael Morais Chiaravalloti, biólogo e mestre em Desenvolvimento Sustentável. Autor do livro “Escolhas Sustentáveis: discutindo biodiversidade, uso da terra, água e aquecimento global” e colaborador de revistas da área de Sustentabilidade. e-mail: rafaelmochi@gmail.com e Facebook.
texto publicado na revista Ideia SócioAmbiental na edição de Junho de 2010.