Na primeira quinzena do mês de Agosto (07/08)* o Diário do Verde esteve em São Paulo para o lançamento da campanha “A energia da democracia é livre“, iniciativa pioneira da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel) que propõe a instituição de um mercado livre de energia no Brasil. Endossada por mais de 60 empresas e organizações do país, a campanha apresentou em sua data de estreia, em primeira mão, por intermédio de Mauricio Garcia (Diretor Regional do Ibope Inteligência), o resultado da 1ª pesquisa nacional sobre “o que deseja e pensa o brasileiro sobre o setor elétrico”, abrindo espaço para a discussão da possibilidade do cidadão ter liberdade de escolha frente ao serviço prestado atualmente pelas companhias elétricas, a exemplo do que ocorre em diferentes regiões do mundo, como os Estados Unidos, União Europeia, Japão, Austrália e Colômbia, só para citar alguns exemplos.
Onde não há um monopólio da comercialização da energia o consumidor fica livre para escolher qual a prestadora de serviço que oferece energia a um menor custo; podendo assim optar por empresas que utilizem matriz elétrica renovável (como a energia eólica e solar) e revender a energia que não utilizará para outras pessoas. Suponhamos que eu tenha placas fotovoltaicas, e que elas gerem o dobro da energia que eu necessito. Este excedente pode ser disponibilizado a outrem, como a própria companhia elétrica, gerando renda para o cidadão.
Realizada pelo IBOPE Inteligência, a pesquisa entrevistou 2.002 brasileiros de 16 anos ou mais em todo o território nacional entre os dias 17 e 22 de Junho de 2014. Com margem de erro de dois pontos percentuais, o estudo aventou dados muito interessantes, que respaldam a visão da Abraceel de que o brasileiro deseja uma reforma profunda no modelo elétrico vigente por parte do governo. Os principais resultados do levantamento apontaram que:
66% dos cidadãos desejam portabilidade da conta de luz como no setor de telefonia, isto é, poder escolher a empresa que oferece energia na sua casa;
67% dos cidadãos consideram os custos com o fornecimento de eletricidade muito altos ou altos;
57% dos cidadãos estão dispostos a trocar o seu fornecedor de energia elétrica;
44% dos cidadãos estão dispostos a trocar o seu fornecedor de eletricidade já em 2014;
48% dos cidadãos acham que o Brasil pode ter crise (racionamento de energia) ainda em 2014;
83% dos cidadãos querem que seja iniciada imediatamente uma campanha para a conscientização do uso da energia elétrica;
77% dos cidadãos gostariam de ter a possibilidade de gerar eletricidade em suas residências por meio de placas fotovoltaicas (energia solar) ou equipamentos eólicos (energia dos ventos);
43% dos cidadãos acredita que a livre escolha dos fornecedores de energia elétrica reduzirá o valor da conta de luz e que
40% dos entrevistados perceberam uma oscilação negativa na qualidade do serviço prestado, ou seja, que a ocorrência de cortes e interrupções de energia na rede estão crescendo.
O Diário do Verde postou na época os principais resultados apontados no estudo em tempo real, na página de fãs do Facebook. Para compreender melhor a ideia, confira abaixo um resumo do que foi discutido ao longo dos três paineis do evento e, ao final, um quadro com as principais razões apontadas pelos idealizadores da campanha para o fomento ao mercado livre.
A VISÃO DO CIDADÃO
Painel 1 – A Visão do Cidadão
No primeiro painel do dia, intitulado “A Visão do Cidadão”, os dados do Ibope foram apresentados às diferentes diferentes personalidades do setor energético, imprensa, representantes dos candidatos à presidência (PSB, PSDB e PT) e líderes governamentais que faziam-se presente no recinto.
Em sua fala, Mauricio Tolmasquim, representante do Governo Federal, defendeu que “dar chance a população é algo importante”, contudo frisou que vê com preocupação a efetividade técnica do projeto, que acarreta na desmantelação do sistema atual de comercialização de energia elétrica. Como grande parte dos contratos de energia foram feitos através do contrato regular eles ainda irão demorar vários anos até terminarem integralmente, já que na média eles têm uma duração de 20 a 30 anos. Ele ponderou que dar chance à população é interessante e importante, mas demonstrou preocupação no que tange à segurança do investidor (com a quebra do monopólio de comercialização da energia elétrica as empresas passarão a competirão entre si, consequentemente, os preços serão instáveis); ao encerramento das concessões de energia (a grande parte dos contratos do setor elétrico são de longo prazo, em média de 20 a 30 anos) e à proteção ao consumidor (que a seu ver precisará contar com uma agência reguladora a fim de evitar abusos por parte das empresas). Tolmasquim não demonstrou entusiasmo com a pesquisa, afirmando que “deve-se ter cautela no resultado das pesquisas”. Isso se deve ao fato de, segundo ele, os dados constatados serem divergentes de outro estudo realizado por parte do Governo Federal, que ao contrário do IBOPE, segundo o mesmo, demonstra satisfação por parte dos consumidores. Ele aproveitou o evento para esclarecer a questão do aumento na tarifa elétrica, que deverá ser de 2,5%, distribuído entre os anos de 2015 a 2017, estando prevista a redução da tarifa de energia elétrica no ano de 2018.
João Bosco de Almeida, à época representante do Eduardo Campos, defendeu o avanço do mercado livre, ressalvando a volatilidade dos preços a curto, médio e longo prazo. A exemplo de Tolmasquim chamou atenção para a questão do encerramento das concessões de energia – propondo uma discussão ampla com o setor de energia e alocação dos riscos existentes e também frisou a questão da proteção ao consumidor. Defendeu ainda uma campanha de educação sistemática de energia, para o consumidor possa compreender a ideia de Mercado Livre de Energia. Encerrou dizendo que riscos existem, mas que “o custo-benefício é muito maior”.
O representante do candidato Aécio Neves, por sua vez, manifestou apoio incisivamente à ideia, destacando a atenção dos ouvintes para o fato de que ela se encontra dentro de um dos eixos da candidatura do presidenciável, que é “Forças de mercado”. Ele atacou veementemente a política de gestão do atual governo, ao afirmar que o Brasil está defasado – pois no ano 2000 já era possível comprar energia com cartão de crédito em Portugal, usando a expressão de que “liberdade com pressão não existe.” Para ele é necessário o país voltar aos princípios adotados pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, sendo preciso um resgate dos modelos de mercado e o estabelecimento de um quadro regulatório.
Reginaldo Medeiros, presidente executivo da Abraceel, salientou a importância da transição do mercado fechado de energia, tomando por embasamento o exemplo positivo dos Estados Unidos. Nos 23 estados estadunidenses que reestruturaram o mercado houve a diminuição de 8% no valor da conta de energia, ao passo que nos estados que não propiciaram a reestruturação do setor elétrico houve aumento de 4%.
No momento dos comentários José Raimundo, da CEMIG (Companhia Energética de Minas Gerais), propôs aos presentes que 30% das cotas do mercado fossem destinadas ao mercado livre.
A VISÃO DO CONSUMIDOR E DA REGULAÇÃO
Painel 2 – A Visão do Consumidor e da Regulação
Finalizada a divulgação dos resultados da pesquisa Ibope, deu-se a exposição de um vídeo a respeito da percepção do consumidor quanto ao mercado livre de energia, que expôs à aplicabilidade do conceito na vida de consumidores da Bélgica, Chile, Escócia, Estados Unidos, França, Holanda, Índia, Inglaterra, Peru e Suíça. As pessoas entrevistadas dos países em questão se posicionaram, sem exceção, favoráveis à proposta, como é possível visualizar abaixo:
O segundo painel contou com a participação de Luiz Theodoro Appel Maurer, especialista em Energia do Banco Mundial, instância ligada à Organização das Nações Unidas (ONU). No decorrer de sua apresentação Maurer realizou um panorama geral a respeito do setor na atualidade, pontuando essencialmente que:
– A ideia de consumidor livre aparecerá pela primeira vez na lei 9.074, de 07/07/1995, onde é estabelecida a demanda mínima de 3MW para ser consumidor livre (pode adquirir energia de qualquer fonte de geração, incluindo as maiores hidrelétricas do país e as mais modernas usinas térmicas e eólicas) e de 500 kW para ser consumidor livre especial (pode negociar e adquirir somente energia gerada por fontes alternativas). No mercado livre, os consumidores podem escolher quem será seu fornecedor de energia, negociando prazos, preços e serviços associados;
– Nos Estados Unidos há três frentes que estão sendo bem exploradas por empresas de tecnologia, notadamente comercialização de energia limpa; uso inteligente de energia e expansão da energia solar;
– Produtos e serviços adicionais podem ser oferecidos no mercado livre para maior eficiência na alocação de recursos, satisfação dos consumidores ou objetivos de natureza social;
– A concorrência no varejo deve aumentar, em razão da pressão do consumidor; da economia e da emergência de novos agentes.
– Se faz necessário o advento de novas tecnologias, modelos de negócio e a abertura de mercado.
Posteriormente Rodrigo Sarmento Garcia, da CNI (Confederação Nacional da Indústria), considerou que para que o mercado livre se estabeleça de maneira efetiva no Brasil será precisão atentar para a sustentabilidade dos negócios e o comportamento e aceitação do mercado. Também vê como imprescindível a necessidade de criação de uma agência reguladora.
Luiz Eduardo Barata Ferreira, da CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), trouxe à luz várias informações relevantes a respeito do assunto, mais precisamente que:
– 26% do mercado brasileiro é mercado livre;
– Existem no país apenas 1.200 consumidores especiais e 600 consumidores livres;
– Há capacidade para que o mercado livre de energia chegue a quase 40% do mercado brasileiro.
Em sua oratória ele frisou que o mercado livre de energia significa a mudança do comercializador, mas não do fornecedor, ocorrendo assim uma quebra do monopólio na distribuição e comercialização de energia. Para ele é preciso uma discussão mais ampla, que contemple todos os setores e segmentos brasileiros.
Por último Ricardo Takemitsu Simabuku encerrou o painel, chamando a atenção para o fato do consumo de energia do setor varejista ser regulamentado pela resolução 570 e de existirem 74 milhões de unidades consumidoras de energia no país.
A VISÃO DO VAREJO
Painel 3 – A Visão do Varejo
No terceiro e último painel subiu ao palco Luiza Trajano, presidente da rede de lojas Magazine Luiza, a 9ª maior empresa varejista do Brasil. Como o tema sugere ela foi convidada para falar a respeito da energia sob a perspectiva do varejo. Em sua fala ela destacou a importância do empresário estar onde, como e quando o cliente quiser, tendo por base as pessoas em primeiro lugar e a tecnologia a serviço do cliente. Frisou que os empresários devem buscar constantemente a inovação e que deve-se existir um ganha-ganha nas relações do serviço de energia elétrica, que é indispensável à população brasileira. Em sua fala deu conselhos preciosos de empreendedorismo, brindando a todos os presentes com seu humor, humildade, competência e inteligência incríveis. Concluiu afirmando que “a renovação é o único caminho para chegarmos ao nosso objetivo.”
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